segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Oxford edita em inglês obra de Euclides da Cunha sobre Amazônia


Folha On-Line - SP

Os ensaios do engenheiro, escritor e sociólogo brasileiro Euclides da Cunha (1866-1909) sobre a região do Amazonas acabam de ser traduzidos para o inglês sob o título "The Amazon: Land Without History".

A edição comentada pertence à série "Library of Latin America" da editora da Universidade de Oxford. A proposta é apresentar a obra de escritores latino-americanos do século 19 e 20 ao público de língua inglesa.

A maioria dos ensaios da nova edição foi recolhida pelo autor em "À margem da história", uma coleção publicada logo após sua trágica morte.

Desde 1909, quando foi morto pelo amante da sua mulher, Euclides da Cunha se tornou um ícone da história intelectual brasileira. Não só pelos recursos de sua escritura e pelos detalhes de sua própria biografia, mas também por ter conseguido descrever a essência do brasileiro como nunca antes e, para muitos críticos, nunca mais.



Segundo os críticos, a ambição do autor era recriar em seus ensaios dedicados à região do Amazonas o sucesso da sua primeira e mais famosa obra, "Os Sertões" (1902), que refletiu o conflito da sociedade brasileira da época a partir da rebelião de Canudos, de 1897.

A obra ganhou ressonância no público e garantiu para o autor, um ano mais tarde, um lugar na Academia Brasileira das Letras e no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Com a fama conquistada e seu estilo estabelecido, o escritor começou a produção dos novos ensaios em 1905, durante sua participação numa expedição binacional para determinar a fronteira entre Peru e Brasil.

Euclides da Cunha descreve a Amazônia com sua inconfundível mistura de imparcialidade científica e apaixonada subjetividade. Na exuberância da floresta, encontra uma paisagem que segue as suas próprias regras e onde a história não teria deixado pegadas.

A posição aparentemente inofensiva dos primeiros ensaios disfarça, segundo Lúcia Sá, autora do prefácio, o projeto colonial do autor. Um aspecto curioso, ela destaca, é que os povos indígenas da região amazônica estão quase completamente ausentes do texto.

O autor parece atribuir o fato às características inóspitas do território "anfíbio" da Amazônia. Ao descrever a região como um deserto, estaria facilitando qualquer esforço posterior de ocupação.

Quando admite a presença indígena, como faz ao comparar os índios do Peru e os do Brasil, a linguagem que utiliza parece inicialmente chocante, e freqüentemente inadmissível, para um leitor do século 21. Freqüentemente as descrições são repugnantes. Fora do seu contexto histórico, pareceria inexplicável a posição privilegiada que Euclides da Cunha sustenta, até nossos dias, na história intelectual brasileira.

No entanto, os ensaios, tão repletos de inconsistências e contradições, paradoxalmente, se transformam num fiel reflexo da esquizofrênica sociedade da época e do esforço de modernização do país.

Uma das grandes conquistas da edição é a tradução de Ronald Sousa, que preserva o tom positivista num inglês às vezes comedido e outras, recarregado. O texto expõe a toda uma nova geração de leitores um texto que descreve num estilo único e inigualável a vasta e conflituosa situação do Brasil há apenas um século.

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